Quando ouço “tardes de verão” sou sempre levada àquelas tardes em que a minha mãe me obrigava quase sempre a dormir a sesta. As tardes em que eu adormecia no divã velho e azul da sala de costura. A porta da sala era aberta para o campo. Portanto, o som dos grilos, o cantar das cigarras, o latido dos cães, a máquina de costura da minha tia Luísa, o apitar do padeiro que entregava sempre pão às 15h, tudo servia para me embalar no sono curto que tirava. Quando acordava, ainda ficava tarde por muito tempo. Ainda dava tempo para lanchar, para fazer cópias e ditados, para chamar a amiga Rosinha das tranças longas e loiras. Eu era a morena, a de cabelo e pele escura. A que inventava jogos e fingia falar outras línguas. Ainda dava para brincarmos às escondidas até a lua nos avisar que era tarde. Até não ouvirmos viva alma nas ruas de terra batida que calcávamos com as sandálias velhas e pés sujos.
Quando ouço “tardes de verão”, lembra-me a melancolia do calor; o perturbador silêncio da tarde; os caminhos desertos da aldeia; as amoras quentes a derreter; a inexistência de ar ou vento; a roupa seca e tesa no estendal; o som apressado dos passos das mulheres a descer a rua em direcção à novena *.
As tardes antes passavam devagar. As tardes agora parecem tão curtas.
* Na fé católica, é um encontro para orações, realizado durante o período de nove dias. Lá na aldeia, e em grande parte das terras que conheço, realiza-se durante todo o mês de Maio, por ser considerado o mês de Maria. Teve a sua origem na Tradição Católica, mas pode ser encontrado noutras tradições ou crenças. Começou entre a Ascensão de Jesus Cristo ao Céu e a descida do Espírito Santo, quando se passaram nove dias (cf. Atos 1,3; 2,1). A Comunidade Cristã teria ficado reunida em torno de Maria, de algumas mulheres e dos Apóstolos por este período. Foi a primeira novena cristã.
1 comentário:
Estou de cara no chão... não tenho conseguido corresponder com aquilo que te prometi, mas é por uma boa causa: o livro.*
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