Ouvimos as histórias dele vezes sem conta. Muitas das vezes,
quase sempre, estávamos os quatro sentados à mesa, depois de uma refeição
cozinhada pelas mãos ásperas e doces da minha mãe. Passou anos a fio a
trabalhar no Porto. Desde os 14 anos que percorria aquelas ruas da Boavista, entrando
e saindo em dezenas de autocarros antes de chegar ao destino. De manhã, eu ouvia
sempre o despertador tocar às 5h20, todos os dias, fosse verão ou inverno. À noite,
muitas das vezes não o via, principalmente naqueles dias chuvosos de inverno em
que o trânsito se acumulava tanto que os carros desligavam os motores. Quando chegava,
já a minha mãe nos tinha deitado (antes já tinha feito os trabalhos de casa
connosco, uma cópia e dois ditados, dado banho e o jantar). Mas nunca, nunca
mesmo a minha mãe jantou sem ele chegar. Guardava esse momento para ele. Não faço
ideia do que falavam à mesa, pois dormia no mais profundo dos sonos no quarto
que partilhava com o meu irmão. Já mais crescidos, e cada um com o seu quarto,
já podíamos ficar acordados até ele chegar e ouvir, sem cansar, as histórias que
ele contava.
Ouvimos as histórias dele vezes sem conta. Muitas delas
repetidas, já as sabia de cor, mas nem por isso deixava de ficar entusiasmada e
ansiosa pelo final, quase sempre em gargalhada.
Hoje é dia da mulher, eu sei, mas também sei que a minha mãe
é uma grande mulher porque tem o meu pai ao seu lado.
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